A Receita Federal (RF) está começando a subir os dados do Brasil na plataforma blockchain b-Connect, de comércio exterior. Além do país, Argentina, Paraguai e Uruguai vão usar a solução. Esse povoamento de informações brasileiras deve durar 15 dias.
No início, a b-Connect servirá para troca de dados sobre os operadores econômicos autorizados (OEAs) de cada país. Essas empresas têm autorização para uma liberação mais rápida de carga nas fronteiras. Mas, a Receita já prevê expansão da plataforma para outros serviços.
Em relação aos outros países, cada um vai colocar seus dados. “Os prazos, por conta da pandemia, foram sendo adiados”, disse ao Blocknews Sérgio Garcia Alencar, coordenador operacional aduaneiro da Receita Federal.
A ideia da RF é incluir, no longo prazo, cerca de 20% das empresas que operam no comércio exterior. Isso seria cerca de 4 mil deles, que processam a maior parte das transações. Agora serão cerca de 200. Enquanto o b-Connect for só para dados dos OEAs, “o sistema é tranquilo”, completou.
Assim, a plataforma resolve um problema de falta de confiança entre os países, o que é muito comum na troca de dados entre nações. Isso porque essa troca envolve temores sobre questões como regulação, língua, soberania e controle de dados e quem paga a conta do sistema.
Além disso, no caso dos OEAs, acaba com as trocas quinzenais de emails – ou seja, dá mais celeridade ao processo e confiança com os dados registrados.
b-Connect destrava desconfianças
Blockchain no comércio exterior está ajudando a tirar essas travas para trocas de dados, disse ao Blocknews Ronald Thompson, auditor-fiscal da Receita Federal que liderou o desenvolvimento da b-Connect na instituição.
“Com blockchain, não é preciso falar para o outro país usar este ou aquele protocolo, certificado ou centro de dados. Você cria um nó que fala com a blockchain, um outro nó fala com a blockchain e tudo acontece”, afirmou.
De acordo com Alencar, essa primeira fase do b-Connect envolve dados menos sensíveis do que se pretende adicionar depois. São informações cadastrais das empresas e são públicas.
No entanto, para cada serviço de compartilhamento de dados, é necessário acordos entre os países que garantam a legalidade dessas trocas. E quanto mais sensíveis os dados, mais delicado é o processo.
Expansão lateral
Segundo Alencar, a previsão é ter uma expansão lateral e uma vertical do b-Connect. A lateral é para permitir que países com acordo de OEA com o Mercosul usem o sistema.
Hoje, há acordo bilateral do Brasil com China, Bolívia e Uruguai. Há, ainda, o acordo entre os quatro países do Mercosul. Brasil e Estados Unidos também discutem acordo há cinco anos. E o Mercosul negocia com a Aliança do Pacífico, formada por Chile, Colômbia, México e Peru.
A Aliança usa Hyperledger Besu e o b-Connect é na Hyperledger Fabric . A ideia é, porém, que cada vai continuar a usar o seu sistema. “O grande pulo do gato é quando conseguirmos integrar as plataformas”, completou o coordenador da Receita Federal.
Expansão vertical
Já a outra expansão da blockchain da Receita Federal com o Mercosul será vertical. “Temos projetos para dois novos canais. Um é a implantação do sistema internacional de trânsito aduaneiro. O outro é o de troca de declarações aduaneiras”, disse Alencar.
O sistema de trânsito aduaneiro é hoje feito em papel. Portanto, o processo é: o país de onde sai uma carga passa as características dela para a fronteira de saída, que passa para a aduana na entrada do outro país, que depois checa se a carga chegou ao destino final. Neles, as informações são mais sensíveis do que os dos OEAs.
No entanto, para entrar em operação, o Brasil precisa entrar no Sistema de Trânsito Internacional Aduaneiro da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi). A proposta do Brasil ao Mercosul é que quando houver a entrada, já seja com blockchain.
“Já a troca de declaração aduaneira é nosso objetivo final”, afirmou Alencar. Nesse caso, trata-se de os países terem informações sobre as cargas antes de chegarem. “Hoje, não há um banco de dados único. Temos que pedir informações uma a uma para os países do Mercosul”, completou o .
Isso deve entrar em análise a partir 2022. É também um sistema que envolve informações ainda mais sensíveis do que as do OEA.
“Abrimos a porteira”
A inclusão dos dados na b-Connect pode ser manual ou automática. O Brasil, por exemplo, está desenvolvendo uma solução para o envio à blockchain de qualquer inclusão, suspensão ou exclusão de certificação de OEA, que é digital.
O b-Connect foi gerado a partir de aprendizados com o b-CPF e b-CNPJ, de compartilhamento desses cadastros entre órgãos do governo. “Foi um aprendizado”, afirmou Thompson.
Houve um protótipo do b-Connect feito pelo Serpro, em 2019 e aos técnicos do Mercosul, com os quais o Brasil tem acordo de reconhecimento mútuo de operador econômico. Na rede, todo os nós são mineradores e isso ajuda a respeitar a soberania de cada país.
Mas, o projeto todo começou na Organização Mundial das Aduanas (WCO em inglês). Lá, onde Alencar participa de discussões, escutou, há cerca de 4 anos, a sugestão de os países explorarem blockchain. E então, falou com Thompson sobre o assunto, que tocou a parte técnica.
“A primeira fase é trocar lista de operadores aduaneiros autorizados. As próximas, você nem faz ideia onde vai parar, porque agora abrirmos a porteira do bem para facilitar o comercio internacional. O Brasil teve a sacada de usar blockchain para resolver o desafio”, afirmou Thompson.