E lá se vão treze anos do primeiro pagamento com bitcoin – e portanto com criptomoeda – de que se tem notícia, que aconteceu em 22 de maio de 2010, quando o programador Laszlo Hanyecz transferiu 10 mil bitcoins, cerca de US$ 25 na época, por duas pizzas. Desde então, os pagamentos com criptomoedas cresceram, mas não no ritmo esperado, já que não é fácil convencer o comércio a aceitar moedas digitais. Diante disso, o mercado criou soluções como cartões e aplicativos conversores de cripto para moeda legal para pagamentos. E parece estar funcionando.
De acordo com um estudo da Insider Intelligence, os valores globais de pagamentos que envolvem criptomoedas estão crescendo todos os anos e os casos de uso se mantém. Tanto que grandes provedores de pagamentos continuam a investir no segmento. Os valores passaram de US$ 2,20 bilhões em 2020 para US$ 8 bilhões em 2022, com previsão de chegar a US$ 11,43 bilhões em 2024. Porém, a previsão de ritmo de crescimento está em baixa, o que a empresa atribui ao inverno cripto. A expectativa é de que, na média, o crescimento global seja de 12,6%.
Empresas como WordPress, Tesla e Expedia e times como o São Paulo Futebol Clube chegaram a anunciar que aceitariam criptomoedas como pagamento. Governos como o de Lugano, na Suíça, tentam incentivar esse uso na cidade. Outros, como o do Rio, anunciaram que aceitam pagamento de impostos. Mas, em boa parte – senão a maioria dos casos, o usuário converte suas criptos para o lojista receber em moeda legal. E usa para isso um sistema centralizado, em geral via exchanges e carteiras digitais, e não o modelo P2P que Satoshi Nakamoto criou.
Bitcoin e altcoins para pagamento com cartão
De acordo com Henrique Teixeira, chefe de desenvolvimento global de negócios da Ripio, empresas do setor criaram soluções para facilitar o uso das criptomoedas em pagamentos. Assim, o usuário pode converter suas criptos na hora do pagamento usando, por exemplo, um cartão de débito, como o Ripio Card. Portanto, pode decidir se vai usar suas moedas digitais ou pagar direto em reais.
No Brasil, a primeira solução que surgiu permitindo o uso do Pix para facilitar tanto o câmbio de moedas, quanto pagamentos, foi o Swapix da Smartpay. A apresentação do produto foi em 2021, mas o lançamento oficial em março de 2022. Hoje, o aplicativo tem suporte para a stablecoin Tether (USDT), a terceira maior cripto em valor de mercado – cerca de US$ 83 bilhões – e a principal moeda usada na plataforma, Tron, Matic e Ethereum.
“Estamos constantemente sentindo o crescimento da solução. Muitos negócios não relacionados a criptomoedas vêm utilizando Tether como meio de pagamento, em especial em jogos e sites de apostas. Hoje, temos uma média diária de 200 novos usuários e 500 transações de clientes recorrentes e novos. Ainda não temos métrica de onde é usada. Porém, pelos monitoramentos percebemos que como por questão de marketing falamos em pagamento com cafezinho, as pessoas estão fazendo testes para ver se dá mesmo para pagar isso com cripto. No caso de games, muitas empresas do setor estão aceitando USDT como moeda”, diz Rocelo Lopes, criador e CEO da Smartpay.
Cafezinho com criptomoeda
Segundo ele, os indícios são de que para o dia a dia, os clientes preferem stablecoin, já que mantém seu valor pareado a ativos como dólar. Para reserva de valor e lucros operacionais, preferem criptomoedas como bitcoin, no entanto. “Tem divisões no mercado. Existe o grupo de quem negocia cripto, que cresce. E tem um outro que usa para entrar em outras plataformas internacionais, em que o crescimento é muito maior. Com a regulamentação, a tendencia é clientes usarem de protocolos de finanças descentralizadas (DeFi) em outros países e precisarem de USDT para chegar até lá.
Para Marcos Lustosa, responsável pelo marketing da CoinEx no Brasil, o real digital poderá ajudar os usuários a entenderem o que é uma cripto e até usarem mais as stablecoins para pagamentos. “Vai ser um caso de educação de usuários sobre troca de ativos digitais por bens reais”, afirma. Para ele, a conexão de stablecoins, tokens não-fungíveis (NFTs) e jogos online vai ser um marco no segmento de criptomoedas, porque envolve pagamentos e renda com as moedas digitais.
Guilherme Nazar, diretor-geral da Binance no Brasil, afirma que num país como o Brasil, que tem mais smartphones do que habitantes, é possível usar o celular e uma conta em exchange “para fazer a feira ou comprar na mercearia da esquina”. “Não à toa, o Brasil é um dos cinco maiores mercados do Binance Card”, afirma.
Bitcoin se tornou investimento
O lançamento do cartão no Brasil foi em janeiro passado e o país agora é um dos cinco maiores mercados do mundo do Binance Card. Dessa forma, superou os da Europa. “Mais de 50% das compras acontecem com despesas do dia a dia, no varejo, como em cafés, restaurantes, mercados e supermercados”, completou.
“Há cerca de cinco anos tinha várias soluções de pagamentos, com maquininhas com QR Code para pagar com criptos. Era uma maquininha legal, sem taxas abusivas. Aí veio o Pix. Além disso, tem quem compra criptomoeda para guardar e muita gente ainda não sabe usar carteira digital. Não é trivial usar bitcoin no dia a dia”, diz Luiz Calado, ex-diretor do Mercado Bitcoin, conselheiro do Omni e professor da Fundação Getulio Vargas em São Paulo (FGV-SP).
Para ele, bitcoin “é uma forma boa de investimento, de se sentir mais forte e poderoso que os bancos” Isso porque o dinheiro é seu mesmo, não está num sistema cheio de travas. Tenta sacar uma quantia alta num banco para ver se você consegue. É cheio de travas, é preciso falar com várias camadas de gerência do banco para ter a liberação do dinheiro”, completa.