Associação do agronegócio usa blockchain para compensar combustível fóssil

Evento discutiu aplicação de blockchain e IoT dos insumos à certificação.

A Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) utilizou blockchain para fazer sua primeira compra e aposentadoria de Créditos de Descarbonização (CBIO) na B3. Cada CBIO representa 1 tonelada de C02 que não foi para a atmosfera e terá de ser comprado por distribuidoras de combustíveis fósseis, mais poluidores, para incentivar a produção dos menos poluentes. Esse é um mercado que pode crescer de forma acelerada nos próximos meses e no qual blockchain é uma solução eficiente.*

A Abag não é obrigada a fazer a compra, mas adquiriu 55 para neutralizar a emissão de gases de efeito estufa gerada, por exemplo, em viagens de membros da associação.

O mercado desses certificados deve crescer neste ano, porque a obrigação de compensação de venda de produtos como gasolina e diesel será contabilizada a partir de 2021, com base nas vendas de 2020. Com isso, pode-se criar um mercado primário estimado em R$ 700 milhões.

A operação aconteceu na sexta-feira (31) e ajuda a promover um mercado que passa pelo agronegócio, com os biocombustíveis.

Plataforma Block C

O processo foi estruturado pela Block C, empresa criada em 2019 e focada em soluções para compensação e neutralização de crédito de carbono. Isso inclui a criação, negociação e rastreamento de ativos ambientais como CBIOs, Reduções Certificadas/Verificadas de Emissões (RCE/RVE) e os Certificados de Energia Renováveis (RECs).

A Abag usa a plataforma criada pela Block C, que pode ser usada por outras empresas também, criando um ecossistema. Adriano Nunes, sócio da empresa, disse ao Blocknews que o processo da Abag foi feito da lavoura à B3 e aposentadoria do certificado. Quando o emissor do certificado consegue a aprovação da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biodiesel (ANP) para emitir o certificado, a Block C inicia a geração do ativo digital.

O CBIO é tokenizado, é feita escrituração da compra pela StoneX e a auditoria da neutralização pela SGS Sustentabilidade. Depois, segue para a B3 para registro e pode ser comercializado ou aposentado. No caso da Abag, foi aposentado, ou seja, não será vendido e vai valer para compensar sua emissão de gases de efeito estufa.

Plataforma Hyperledger Fabric

Blockchain foi escolhida para os processos da Block C porque cria ecossistemas de membros que precisam ter confiança dos dados compartilhados. Um banco de dados exigiria um controle centralizado, com políticas de governança que não seriam suficientes para eliminar toda a desconfiança entre os participantes, disse Eduardo Terzariol, gerente sênior técnico da Logicalis, parceira da Block C nos projetos. “Blockchain se encaixou como uma luva”, completou.

Mas há um ganho de tempo, diz Nunes, porque a plataforma sistematiza o processo, permite o compartilhamento das informações entre os participantes e substituiu os processos manuais.

A plataforma usada é a Hyperledger Fabric. No caso da Abag, a capacidade de transação por segundo da plataforma não é um problema, porque a demanda maior não é por operações muito rápidas, em tempo real. O que conta são outras funcionalidades, como o uso simultâneo por vários participantes, afirmou Terzariol.

Outro ponto que pesou na escolha da Hyperledger foi a maior facilidade de encontrar especialistas nessa plataforma, disse o gerente da Logicalis. Há alguns anos, a empresa chegou a usar a Quorum, do JP Morgan, mais difícil de achar especialistas.

O custo de uso da plataforma para um membro com um volume pequeno de certificados é de R$ 2 mil a R$ 4 mil ao ano. Esse valor inclui inventário, escolha de ativos, certificação e emissão.

Um mercado para blockchain

“Estamos vendo o nascimento de um ativo novo”, afirmou Nunes. E há muito espaço aí para blockchain. Segundo a B3, a projeção do governo de que as distribuidoras terão de comprar 14 milhões para compensar a venda de combustível fóssil deste ano vai acelerar esse mercado.

As negociações de CBIOs na B3 começaram no final de abril, mas o volume ainda é pequeno, alcançando até agora cerca de 145 mil certificados. O valor dos certificados, hoje, é de em média R$ 20 (por volta de US$ 4). Mas as usinas esperam que chege a R$ 50 (em torno de US$ 10). Ou seja, se esse valor for confirmado, seria um mercado primário de R$ 700 milhões.

No caso do certificado tokenizado, a intenção da Block C é enviar, no futuro, o certificado já digitalizado para a B3 por meio de uma carteira digital. Outro ponto ainda pendente na digitalização do processo é a aposentadoria do certificado.

A empresa aguarda receber da B3 o comprovante de aposentadoria dos CBIOs da Abag para saber como isso será feito pela bolsa. “A B3 nunca fez isso porque ninguém nunca aposentou ou neutralizou CBIOs”, completou Nunes.

“Estamos trabalhando para ter uma solução em blockchain para isso também”. Com isso, ficarão registradas a transação e a aposentadoria em blockchain com o uso de hashes. A aposentadoria de certificados na plataforma deve ser possível até o final do ano.

O que pode surgir também é um mercado secundário de CBIOs, diz o sócio da Block C. Isso porque empresa podem comprar só para fazerem dinheiro, tentando vender mais caro quando as distribuidoras correrem atrás dos certificados para baterem suas metas.

Esse mercado secundário também interessa à empresa, que começou pensando em oferecer serviços desde o pedido de certificação, mas percebeu que boa parte dos emissores, as usinas de biocombustíveis, já fazem isso sozinha.

Biogás e Anjos do Brasil

Novos projeto, similares ao da Abag, incluem a Anjos do Brasil. O aeroporto de Viracopos (Campinas, SP) foi o primeiro a usar a plataforma da Block C, para 40 mil RECs, certificados de energia renovável, no primeiro semestre de 2019.

Nunes afirmou que a empresa está criando módulos que devem se conectar. Além do negócio B2B, a empresa criou a ZCO2, uma plataforma para B2C que funciona como um programa de fidelidade. Quem emite créditos de carbono vende para cidadãos que querem incentivar a economia sustentável. Em troca, ganham pontos para usarem nas empresas parceiras do projeto. A 99 em Manaus fez parceria. Tudo em blockchain. A ZCO2 nasceu antes da plataforma B2B, mas ainda é um MVP tentando se provar, disse o sócio.

No final, o que a Block C quer é conectar diversos ecossistemas e suas plataformas.

A empresa tem 6 funcionários e trabalha em parceria com a StoneX e a Logicalis. Imagina que pode chegar superar a meta de faturamento de R$ 1 milhão em 2020 com o desenvolvimento do mercado de CBIOs.

O CBIO é parte do RenovaBio, a Política Nacional de Biocombustíveis que faz parte do compromisso do Brasil feito na COP-21 para reduzir a emissão de carbono no setor de combustíveis e aumentar o uso de bioenergia na matriz energética brasileira para cerca de 18% até 2030.

*Errata: O CBIO não equivale a 1 tonelada de biocombustível, como informado anteriormente. Correção feita às 21h13.

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